16 de setembro de 2024
O 39º painel do 21º Congresso Brasileiro de Contabilidade (CBC) tratou de um tema que tem ganhado mais espaço na sociedade, mas que ainda necessita de avanços: a diversidade. O assunto foi abordado a partir da sua relação com a competência. O objetivo da atividade foi discutir a competência além das diferenças.
O assunto foi apresentando pelo professor doutor Samuel Durso; pela embaixadora do Ibracon Jovem, Maria Júlia Esteves; e mediado pela auditora, executiva trans-feminina e representante do Ibracon no Comitê Brasileiro de Pronunciamentos de Sustentabilidade (CBPS), Danielle Torres.
Na ocasião, o professor Samuel Durso, falou sobre o peso da desigualdade de oportunidades na formação dos alunos e a falta de preparo dos docentes para lidar com as diferenças e construir estratégias de ensino que considerem que a sociedade é diversa.
O acadêmico esclareceu que há muitas pessoas com competências nos grupos não hegemônicos. Contudo, para alcançarem o desenvolvimento dessas habilidades, é necessária a superação de obstáculos e, nesse cenário, há o chamado “custo da resiliência”. “A resiliência, independentemente, do contexto que estamos, é um processo de adaptação frente a um contexto de adversidade. Se for em um cenário educacional, por exemplo, seria as pessoas vivenciarem ou superarem as dificuldades, utilizando recursos pessoais e ambientais para enfrentarem essas dificuldades e conseguir ter um bom desempenho. Então é um contexto de bom desenvolvimento frente a um texto de adversidade”, contextualiza Durso.
O professor pondera, no entanto, que apesar de, certas vezes, as pessoas concluírem as suas atividades e terem sucesso, esses resultados podem carregar alguns esforços que trazem prejuízos e desgastes. A tendência da sociedade é enxergar essas superações como algo positivo e heróico, mas a questão não pode ser resumida dessa forma. “Isso tudo gera em nós uma demanda. O custo não é necessariamente o custo financeiro. Também pode ser o custo financeiro, mas, geralmente, é o custo de se doar, fazer mais do que outras pessoas precisariam para superar aquela dificuldade. Então, se eu tenho que conciliar, por exemplo, as minhas demandas familiares com as demandas acadêmicas e profissionais, eu acabo tendo menos tempo para o prazer, o lazer e o ócio. Então, é uma espécie de custo. Você chegar ao final de uma formação, ou seja, você se mostrou resiliente frente a esse contexto de adversidade, mas você entregou alguma coisa e, às vezes, entregar alguma coisa gera consequências. Não podemos ter só a visão positiva”, explicou.
O professor ainda refletiu sobre as dificuldades dos estudantes que precisam conciliar a formação com o trabalho e da importância e da responsabilidade das universidades em corrigir essas distorções sociais. Por outro lado, o acadêmico destacou que nas faculdades de Ciências Contábeis há um ponto positivo: esses espaços de ensino recebem um público muito diverso, o que pode colaborar para os estudantes entrarem no mercado mais bem preparados para lidar com a diversidade.
A embaixadora do Ibracon Jovem, Maria Júlia Esteves, contou a sua trajetória de vida e a sua experiência como uma mulher negra no âmbito da auditoria. Formada na Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), contou que, ao ingressar no mercado de trabalho, por meio de um programa de trainee, sentiu sobre “o que era ser negra em um ambiente corporativo”. Mais tarde, segundo a contadora, participou de programas de inclusão da PwC e começou a se sentir melhor em suas rotinas profissionais. Atualmente, Esteves também é protagonista em dois projetos paralelos. No Ibracon Jovem, realiza um trabalho voltado para as questões geracionais. A iniciativa tem objetivo de reter jovens na profissão. A auditora também é uma das co-fundadoras do Instituto Black Office (IBO ), um instituto que oferece treinamentos e mentorias totalmente gratuitas para alavancar carreiras de profissionais negros no mercado corporativo.
A profissional contou que viu em uma pesquisa que as pessoas que fazem parte de grupo minorizados têm 25% mais chances de desenvolver problemas mentais, como burnout e depressão. De acordo com a contadora, tudo isso por conta do preconceito que enfrentam no ambiente corporativo. “Eu acredito que essa é a principal mazela. Com essa insegurança que a pessoa tem, ela não vai entregar o que ela tem competência para entregar. Foi o que eu comentei: quando estamos seguros em ser quem somos no ambiente corporativo, eu tenho certeza, você entrega muito mais, na sua máxima potência, porque você está seguro, você está participando de uma ambiente seguro, onde você é acolhido e pertencente”, afirmou.
“É solitário olhar para a sociedade e não se entender”, esta foi uma das frases da executiva e auditora, Danielle Torres, compartilhadas no painel e que expressam o sentimento de dor e de exclusão que os grupos minoritários vivem no dia a dia. Ao lado desse desabado, também estavam palavras como “vergonha” e “solidão” e o relato das pressões sociais para que ela “se encaixasse” aos padrões pré-estabelecidos.
De acordo com a profissional, as sua missões ao ingressar no mercado foram “deixar de ser uma vergonha” e ser menos feminina. A contadora explica que buscava abandonar quem era de fato para se desenvolver no meio social. Foram dez anos nessa busca pela “adequação”, lutando para ser um masculino padrão, “com algum grau de sucesso, mas com alto grau de sofrimento”. Até que aos 28 anos teve uma depressão, questionou a posição em que estava e começou a ouvir falar sobre “trans”, algo raro naquele período. Foi, então, que decidiu ser quem era. Torres disse que não imaginava que fosse conseguir desenvolver uma carreira e que seria mais bem sucedida depois de sua decisão e esclareceu o porquê: “O que é ser competente quando você está no extremo da diversidade social?”.
A auditoria também refletiu sobre o que é ser diverso. “As pessoas olham para mim e pensam que eu sou diversa, mas todo mundo é diverso”, destacou e argumentou que muitos quesitos geram diversidade, como local de nascimento, sotaque, escola que estudou, classe social.
Sobre a mudança nas culturas organizacionais e a inclusão, Torres destacou que as oportunidades mudam perspectivas. “O que eu falo para as organizações em geral é para incluírem porque na hora que incluímos e damos a oportunidades equitativas; na hora que a pessoa que está trabalhando com a gente ascende a uma posição de liderança; na hora que colocamos em um painel uma pessoa que tem a diversidade, mas é especialista em um tema e ela fala sobre o tema e não sobre a diversidade; tudo isso é o que faz as pessoas pensarem diferente”, orientou.
Fonte: Comunicação CFC
Por Comunicação Ibracon
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