Artigo: Ceticismo na auditoria é peça chave para proteger credibilidade corporativa - Ibracon
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Artigo: Ceticismo na auditoria é peça chave para proteger credibilidade corporativa

13 de junho de 2024

Por Antoninho Marmo Trevisan*

Para Conjur – Publicado em 11.06.2024

No cenário complexo da auditoria independente e do mercado corporativo, onde a detecção de fraudes em relatórios tornou-se uma preocupação crucial, o ceticismo emerge como pilar ético indispensável para a preservação da confiabilidade do trabalho do auditor independente. A habilidade de adotar uma postura crítica diante das informações, questionar assertivamente e validar evidências torna-se um escudo fundamental contra os desafios inerentes à salvaguarda da credibilidade financeira.

Primeiramente, é fundamental salientar que a Auditoria independente é uma profissão altamente regulada, incluindo no que diz respeito ao ceticismo. As regras e as definições traçadas pelo Conselho Internacional de Normas de Auditoria e Asseguração (Iaasb), adotadas em nosso país pelo Conselho Federal de Contabilidade (CFC), dentre elas a Norma Brasileira de Contabilidade de Auditoria independente de Informação Contábil Histórica (NBC TA 200), estabelecem os objetivos gerais da atividade e como os trabalhos devem ser conduzidos.

Esses conteúdos definem o ceticismo como “a postura que inclui mente questionadora e alerta para condições que possam indicar possível distorção devido a erro ou fraude e uma avaliação crítica das evidências de auditoria”.

Prejulgamento

Fica claro que o auditor não deve prejulgar a honestidade ou a desonestidade dos responsáveis pela elaboração das demonstrações contábeis antes da análise das evidências que apoiem sua decisão. Contudo, para entender melhor todos os fatores inerentes ao ceticismo, devem ser consideradas também as características das evidências, do cliente, do ambiente externo e dos riscos envolvidos no negócio auditado.

Vale ressaltar que o auditor trabalha sobre os relatórios financeiros preparados pela companhia. Não é dele, mas, sim, da administração da entidade, a responsabilidade pela elaboração desses relatórios.

O papel do auditor consiste em emitir sua opinião profissional, caso tenha obtido evidências suficientes de que as demonstrações financeiras estão livres de distorções relevantes e retratam com razoável segurança a posição patrimonial da companhia. Para que os auditores possam exercer seu trabalho da forma mais efetiva possível, portanto, é fundamental entender as funções e responsabilidades de cada estrutura dentro das empresas.

Essa diferenciação é especialmente importante quando se trata de casos de fraudes. A identificação desse tipo de delito, cujas causas e motivações são diversas, causa um grande gap de expectativas, principalmente nas auditorias de grandes empresas, companhias listadas em bolsa de valores, instituições financeiras e seguradoras.

É necessário considerar a confiabilidade das informações, os controles sobre sua elaboração e manutenção e o potencial de burla por parte da organização auditada.

Como não é atribuição do auditor independente autenticar ou verificar a veracidade de documentos, a norma destaca que a auditoria deve aceitar registros e informações como genuínos, a não ser que haja evidências para duvidar de sua autenticidade, ou seja, algum motivo para investigação.

Investigação oficial

Mas é preciso deixar claro que a auditoria independente não é uma investigação oficial de suposto delito, assim como seus profissionais não têm a prerrogativa e nem instrumentos para uma investigação mais profunda.

Existem casos em que fraudes contábeis foram conduzidas de maneira tão meticulosa, com o envolvimento inclusive da alta administração e sua equipe, que tornam a detecção pela auditoria muito improvável. Após a descoberta da fraude, os pontos que deveriam ser analisados com maior detalhamento à época dos acontecimentos ficam mais claros, assim como o nível de evidências apresentadas. E nesses casos até o ceticismo profissional empregado pareciam ser suficientes e até corroborado por órgãos reguladores.

Os procedimentos de avaliação previstos na norma oficial não são taxativos e incluem a necessária indagação à administração, terceiros, auditoria interna e avaliação dos fatores de risco de fraude. Esse último ponto é destaque para que o auditor possa, empregando o ceticismo profissional, identificar eventos ou situações que indiquem qualquer pressão para fraudar registros contábeis e obter vantagens financeiras.

A capacidade de questionar, desafiar e validar informações é o que torna uma auditoria eficaz e confiável. Ao incorporar o ceticismo como uma prática central, os auditores desempenham um papel central na promoção da transparência nos mercados. A emissão de uma opinião de auditoria exige que o profissional compreenda o ambiente de controles internos em que se deu a preparação das informações contábeis. Para isso, todas as estruturas de governança devem cooperar.

A aplicação do ceticismo profissional contribui para aumentar as chances de se detectar riscos potenciais e áreas suscetíveis a fraudes, bem como numa avaliação mais aprofundada e precisa. A natureza dinâmica dos negócios exige que os auditores se adaptem continuamente. Por isso, o ceticismo é crucial tanto para lidar com novas tecnologias, como a permanente evolução das regulações e modelos de negócios, garantindo que as práticas de auditoria permaneçam sempre relevantes e eficazes.

*Antoninho Marmo Trevisan é profissional da contabilidade e auditor independente, fundador da Trevisan Escola de Negócios. Especialista participante do livro “Auditoria independente: Missão e Responsabilidades — Estudos e Pareceres”, do Ibracon (Instituto de Auditoria independente do Brasil).